quinta-feira, maio 27, 2004

Mãos de Tesoura

Outro dia eu li um post no blog do Gato Tobias falando sobre o fenômeno do bode espiatório. Ele explicava que é comum em alguns grupos de símios escolher um indivíduo pra dar porrada e expulsar do convívio, mesmo que o 'cidadão' não tenha feito nada. Segundo o Gato, essa é uma forma psssiva de inibir a violência no grupo.

E é foda como isso se aplica a nós, humanos. Uma simples acusação pode arruinar a vida de uma pessoa. Por que? Porque pra muita gente, a acusação já vale a sentença. Não precisa ter provas, é só fulano apontar e dizer "aquele ali fez isso". E aí a história vai crescendo, uma informação duvidosa se torna verdade absoluta, as fofocas vão se solidificanto...

Um exemplo simples. Ano passado, assaltaram a uma farmácia aqui em Salvador. Houve tiroteio entre os bandidos e a polícia, sendo que um garoto inocente acabou sendo baleado. Eu não sei exatamente por que razão, mas todas as suspeitas recaíram sobre policial. A mãe do garoto chegou até a apontar para o PM gritando "assassino". Até onde eu lembro, não provaram nada de imediato e o assunto morreu na mídia.

Semana passada estava no banco e dois homens começaram a conversar sobre este caso. Um deles era vizinho do tal policial e começou a falar sobre tudo que o cara passou. Contou que ele entrou em depressão, chorava o tempo inteiro, não conseguia mais trabalhar. Contou também que naquela semana, o último resultado da perícia havia saído, comprovando que a bala que matou o menino não era do policial, mas, sim, do ladrão.

Lindo, né? Não vi nada chamativo sobre isso no jornal. Na TV, não apareceu a mão do menino apontando para o policial e gritando "inocente". Por que será?

Num outro caso, um francês amigo nosso foi acusado de racismo por um pilantra caça-níquel que merece a morte mais dolorosa do universo. Falei sobre isso no fotolog uma vez, mas só vou me pronunciar abertamente sobre isso quando as últimas sentenças saírem. Posso ir adiantando que o ministério público, depois de muita investigação, apurou que NÃO HOUVE CRIME DE RACISMO.

Mas isso não parece ter sido suficiente para as entidades que se auto-intitulam defensoras da causa negra aqui na Bahia (movimento negro, ilê ayê, banda didá e esses diabos todos). Acreditem vocês que essas associações assinaram uma carta pressionando o promotor pela condenação do francês SEM NEM SABER O QUE TINHA ACONTECIDO DE VERDADE. Só porque ele era gringo e o outro era baiano e preto. Para essas pessoas, isso já basta. Ao invés de se mobilizarem para denunciar os grupos de extermínio de jovens negros que atuam em vários bairros pobres de Salvador, ou se preocuparem com os verdadeiros problemas da comunidade negra, esses caras preferem ficar apoiando pilantra que só quer tirar dinheiro de gente honesta. Então tá.

Explicando: tudo isso veio à minha mente porque eu acabo de assistir "Edward, mãos de tesoura". É um filme que me faz chorar muito. Choro de ódio, de tristeza, de deslumbre. Não sei se vocês lembram da virada da história, quando todas as pessoas que no começo aplaudiam e puxavam o saco do Edward começam a acusá-lo, discriminá-lo, isolam a família que o hospeda...

É por isso que Cristou ficou famoso. O cara não apontava e, mesmo quando não pediam, perdoava. E com tanta gente se dizendo Cristã nessa porra de mundo, não vejo o exemplo sendo seguido.

Sinceramente, só mandando a raça humana pra puta que pariu.